LÁ DO CABRESTO SEM NÓ
Por Luciano Ferraz
Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios - TJDFT
Circunscrição : 1 - BRASILIProcesso : 2008.01.1.053894-5
Vara : 216 - DECIMA SEXTA VARA CIVEL
Processo : 2008.01.1.053894-5
Feito : OBRIGACAO DE FAZER
Requerente : UNAFISCO
Requerido : SINDIRECEITA SIND NAC ANALISTAS TRIBUT REC FED DO BRASIL
SENTENÇA
Trata-se de ação de conhecimento, sob rito ordinário, ajuizada por UNAFISCO REGIONAL DE SÃO PAULO - ASSOCIAÇÃO DOS AUDITORES FISCAIS DA RECEITA FEDERAL DO ESTADO DE SÃO PAULO contra SINDICATO NACIONAL DOS ANALISTAS TRIBUTÁRIOS DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL - SINDIRECEITA, partes devidamente qualificadas nos autos.
Narra a parte autora que a parte requerida, em seu Boletim nº 52, de 19 de março de 2008, divulgou uma matéria intitulada “Analistas Tributários apreendem 30 notebooks em Belém/PA”. Argumenta que a notícia divulgada faz referência a atos que, se praticados, invadiram as atribuições privativas dos Auditores Fiscais da Receita do Brasil, conforme previsão contida no artigo 6º, alínea “c”, da Lei nº 10.593/02. Sustenta, assim, que a matéria veiculada contém notícia inverossímil, hábil a ensejar direito de resposta, nos termos do artigo 29 da Lei nº 5.250/67. Aduz que notificou extrajudicialmente a requerida para que garantisse o seu direito de resposta no periódico imediatamente subsequente, mas não obteve êxito. Afirma que seu direito está assegurado também pelo artigo 5º, V, da Constituição Federal. Defende a aplicação do direito ao contraditório, em função da aplicabilidade da eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações privadas. Requer, ao final, a condenação do requerido a permitir o direito de resposta, por meio de divulgação no mesmo meio de comunicação utilizado para a divulgação da notícia ora atacada, com o mesmo tamanho e destaque. A inicial veio instruída com documentos (fls. 14/59).
O pedido de antecipação de tutela foi indeferido (fl. 61). Contra essa decisão o requerente interpôs agravo de instrumento (fls. 63/106 e 112/121), ao qual foi negado seguimento (fls. 123/133).
Devidamente citado, o réu apresentou contestação (fls. 139/158), em que suscita preliminar de ilegitimidade ativa. No mérito, alega que ao Analista Tributário cabe realizar todos os atos necessários para a finalidade da Receita Federal do Brasil, inclusive os relacionados às atribuições privativas de Auditor Fiscal. Ressalta que a discussão sobre as atribuições entre as duas carreiras encontra-se em nível político, uma vez que não há legislação precisa quanto ao tema. Sustenta que as atribuições dos cargos são mescladas, e que não houve invasão de competência, nem desvio de função na apreensão noticiada pela matéria. Por fim, pugna pela aplicação das penalidades por litigância de má-fé à autora. Trouxe, ainda, a documentação de fls. 159/203.
A parte autora manifestou-se em réplica (fls. 210/217 e 220/227). Intimadas para especificarem provas, a parte autora requereu o depoimento pessoal do representante legal do réu (fl. 231), enquanto a parte requerida postulou pela produção de prova testemunhal (fls. 232/233).
Realizada audiência preliminar, a tentativa de acordo foi infrutífera, tendo ambas as partes postulado pelo julgamento antecipado da lide (fls. 238).
É o breve relato. Decido.
O processo se encontra suficientemente instruído, sendo desnecessária a colheita de prova em audiência, razão pela qual julgo antecipadamente a lide, nos moldes do artigo 330, inciso I, do Código de Processo Civil, conforme, inclusive, foi requerido pelas partes por ocasião de audiência preliminar.
A preliminar de ilegitimidade ativa suscitada na peça contestatória não deve prosperar. A associação autora detém legitimação extraordinária para pleitear direitos da categoria que representa. No caso, como a questão envolve o interesse da categoria dos auditores fiscais, inegável a legitimidade ativa do requerente para atuar em juízo como substituto processual.
Rejeito, assim, a preliminar.
No mérito, verifica-se dos autos que a parte autora postula direito de resposta contra matéria publicada em um boletim informativo publicado pela parte requerida. Para tanto, fundamenta sua pretensão nos artigos 5º, inciso V, da Constituição Federal e 29, “caput”, da Lei nº 5.250/67, os quais possuem a seguinte redação:
Art. 5º (…)
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além de indenização por dano material, moral ou à imagem.
Art . 29. Toda pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade pública, que for acusado ou ofendido em publicação feita em jornal ou periódico, ou em transmissão de radiodifusão, ou a cujo respeito os meios de informação e divulgação veicularem fato inverídico ou, errôneo, tem direito a resposta ou retificação.
Analisando o conteúdo da matéria intitulada “Analistas-Tributários apreendem 30 notebooks em Belém/PA”, que foi veiculada no Boletim nº 52, de 19 de março de 2008 (fl. 51), chego à conclusão de que não houve qualquer ofensa ou abuso cometido contra a requerente ou aos seus associados, nem existiu a divulgação de qualquer fato inverídico ou errôneo, de modo que não há qualquer justificativa para o reconhecimento do direito de resposta postulado na peça de ingresso.
Veja-se que a notícia em questão apenas divulga uma ação realizada por integrantes da categoria na operação realizada em lojas na cidade de Belém/PA, em que analistas tributários apreenderam equipamentos de informática em situação irregular. A única referência indireta feita aos associados da requerente foi a de que naquela data a categoria estava no seu primeiro dia de greve, o que corresponde à verdade, como admitido na própria petição inicial.
A tese sustentada pela parte autora de que a operação feita pelos analistas tributários, objeto da notícia em questão, representaria invasão das atribuições dos auditores fiscais da receita federal não merece guarida.
A Lei nº 10.593/02, com a redação dada pela Lei nº 11.457/07, em seu artigo 6º, inciso I, alínea “c”, estabelece que compete ao cargo de Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil, em caráter privativo, “executar procedimentos de fiscalização, praticando os atos definidos na legislação específica, inclusive os relacionados com o controle aduaneiro, apreensão de mercadorias, livros, documentos, materiais, equipamentos e assemelhados”. Já o §2º, inciso I, do mesmo artigo 6º do referido diploma legal dispõe que incumbe ao Analista Tributário da Receita Federal “exercer atividades de natureza técnica, acessórias ou preparatórias ao exercício das atribuições privativas dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil”.
Da leitura desses dispositivos, extrai-se que aos auditores fiscais é atribuída a competência privativa para executar procedimentos de fiscalização, porém aos analistas tributários é delegado o exercício de atividades técnicas, acessórias ou preparatórias àquela atribuição. Sob esse enfoque, a apreensão de mercadorias irregulares não pode ser considerada como usurpação de atribuições dos auditores fiscais pelos analistas tributários, na medida em que tal ato constitui-se como uma atividade acessória ou preparatória do procedimento de fiscalização.
A menos que se pretenda reduzir o procedimento de fiscalização, de competência privativa dos auditores fiscais, ao mero ato de apreensão de mercadorias irregulares, observa-se que não houve qualquer invasão de função na operação realizada pelos analistas tributários, que foi objeto da notícia ora questionada. Assim, considerando que a reportagem questionada pelo requerente limitou-se a narrar um acontecimento, sem alteração da verdade e sem causar qualquer ofensa ou violação de direito de terceiros, encontrando-se, portanto, dentro dos limites da garantida fundamental da liberdade de informação jornalísitca, não cabe o reconhecimento, no caso em exame, do direito de resposta.
Por fim, não há falar em sanções por litigância de má-fé, pois não vejo a presença do dolo de prejudicar o processo, necessário para caracterizar a penalidade de litigância de má-fé. A pretensão deduzida na inicial, com a apresentação da versão da parte autora para os fatos não evidencia, como quer a parte requerida, a alteração da verdade ou a utilização do processo para conseguir objetivo ilegal. Fosse assim, a multa prevista no artigo 18 do CPC teria de ser aplicada para as partes sucumbentes em todas as causas, pois, ao não terem sua versão acolhida pelo juiz, estariam, necessariamente, praticando a litigância de má-fé.
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado na inicial, com resolução de mérito, nos termos do artigo 269, I, do CPC.
Condeno o autoro pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), com fulcro no art. 20, §4º, do CPC.
Transitada em julgado a presente sentença, e não havendo outros requerimentos, intime-se o réu quanto ao recolhimento das custas em aberto, dê-se baixa e arquivem-se.
Sentença registrada nesta data. Publique-se. Intimem-se.
Brasília - DF, quinta-feira, 9 de dezembro de 2010 às 13h30.
Tiago Fontes Moretto
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