BRASÍLIA - Depois de intensificar as operações de fiscalização na Tríplice
Fronteira (Brasil, Argentina e Paraguai), a Receita Federal apreendeu nada menos
que R$ 436,4 milhões em produtos de contrabando ou piratas em 2010, em 2.223
ações. Trata-se de um volume 80,78% maior que o registrado no ano anterior. Além
de mercadorias, agentes alfandegários confiscaram milhares de veículos,
inclusive modelos de luxo usados por golpistas para tentar não despertar
suspeitas ao longo da Ponte da Amizade. Outros, de tão velhos - os
contrabandistas sabem do risco de perdê-los - acabam empilhados no depósito do
Fisco em Foz do Iguaçu.
Foram 7.245 automóveis tirados de circulação somente em 2010. Nos três
primeiros meses deste ano, o número de veículos recolhidos já ultrapassa 2.500,
sinal de que pode ser batido um novo recorde. As operações de apreensão são
verdadeiros thrillers de ação, com direito a perseguição noturna com lanchas,
equipes em terra e dois helicópteros. As aeronaves monitoram as embarcações que
recebem produtos no lado paraguaio do Rio Paraná e se dirigem para a margem
brasileira, onde seus ocupantes tentam descarregar mercadorias em carros que são
escondidos em depósitos.
- Nesses casos, não é necessário termos um mandado de busca e apreensão
porque os contrabandistas são presos em flagrante - revelou o coordenador
especial de Vigilância e Repressão da Receita Federal, Osmar Madeira.
Imagens gravadas pela Receita durante as operações, às quais O GLOBO teve
acesso, mostram não só embarques e desembarques de produtos (numa cena, um grupo
enche o porta-malas de um veículo com mercadorias retiradas de um barco
recém-chegado do Paraguai), mas também o momento em que um grupo de
contrabandistas a bordo de uma lancha percebe que está sendo monitorado e passa
do ponto de receptação das mercadorias, buscando esconderijo em um canal
próximo, no lado brasileiro da fronteira.
Eletroeletrônicos e cigarros são os mais contrabandeados
Os produtos contrabandeados mais recolhidos pelas autoridades no ano passado
foram eletroeletrônicos (16%) e cigarros (13,01%, ou 120 milhões de maços), de
acordo com um levantamento. Em terceiro lugar na lista, um grande motivo de
preocupação: óculos de sol. Foram 6,5 milhões de pares trazidos ilegalmente para
o país, em sua maioria piratas. Óculos de grau também têm sido importados de
maneira ilegal, por conta das altas taxas de antidumping aplicadas sobre o
produto, segundo Madeira.
O escritório da Luxottica em Roma, representante de marcas como a Ray-Ban,
informou que a empresa tem agido contra a falsificação de seus produtos e que
prepara uma ação específica para o Brasil a partir de junho. A empresa destacou
que as cópias de seus óculos podem fazer mal à vista e à pele.
O contrabando de medicamentos também preocupa as autoridades brasileiras. Em
2010, cerca de 2 milhões de remédios foram trazidos para o país ilegalmente. Na
lista dos preferidos dos criminosos estão o Viagra e anabolizantes. Antes da
quebra da patente do Viagra, quatro comprimidos custavam cerca de R$ 80, ou
seja, R$ 20 por pílula. Hoje, o preço caiu para R$ 5 cada. O problema é que, no
Paraguai, um comprimido sai por apenas R$ 0,80.
Medicamentos falsos preocupam autoridades
Segundo o coordenador especial de Vigilância e Repressão da Receita, a maior
parte dos medicamentos contrabandeados têm quantidade insuficiente do princípio
ativo original em suas fórmulas. A Receita chegou a apreender algumas cartelas
de remédios contra o câncer que nada tinham para combater a doença.
Fabricante do Viagra, a Pfizer informou que toma várias medidas para evitar a
falsificação de seus medicamentos, como lacres de segurança. Como o medicamente
é muito visado por falsificadores, adicionou um selo nas embalagens. "A compra
de medicamentos só deve ser feita em estabelecimentos credenciados e idôneos.
Além disso, o paciente deve exigir sua nota fiscal. Essas são formas de garantir
a procedência do que está comprando", frisou o laboratório em uma nota.
Os Estados Unidos divulgarão nos próximos dias a lista suja dos países que
não têm feito o dever de casa contra a pirataria. O Brasil, que saiu da relação
no ano passado, deve se manter assim, de acordo om Madeira. O país é o único
integrante do Brics (grupo que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do
Sul) que deverá ficar fora da lista.
Porém, a Receita reconhece que seus agentes ainda estão longe de ter acesso a
todos os produtos que entram ilegalmente no país. Para o presidente da
Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade, em um momento no qual
o real valorizado facilita as importações, o câmbio também favorece o
contrabando.
- A indústria já tem muita dificuldade para competir com o importado legal.
Concorrer contra o pirata ou o contrabandeado é impossível. Medidas duras devem
ser adotadas para coibir as práticas ilegais. É um absurdo existir feiras de
importados em Brasília e Belo Horizonte, onde todos sabem o que há ali - disse
Andrade.
Segundo Andrade, essas feiras têm comerciantes que não pagam impostos nem
encargos trabalhistas, e ainda competem com lojas cujos donos seguem a lei:
- Se a ideia é gerar emprego e renda, seria melhor criar um shopping de
produtos nacionais com isenção de impostos. O que se faz hoje é cultivar o
importado sem impostos.
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