INFLAÇÃO DIMINUI GANHO REAL NOS ACORDOS SALARIAIS
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Autor(es): João Villaverde e Júlia Pitthan | De São Paulo e Florianópolis
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Valor Econômico - 20/06/2011
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A inflação mais alta e a desaceleração da economia já influenciam as negociações salariais. Categorias com data-base em maio e junho fecharam acordos salariais com reajustes reais inferiores aos do ano passado ou até limitados à reposição da inflação. Além do setor privado, o aperto chegou ao setor público. Nas empresas do grupo Eletrobras e no Serpro, a orientação é limitar o reajuste salarial à inflação dos últimos meses, sem aumento real, como medida de ajuste fiscal.
Conjuntura: Empresários falam em desaceleração para reduzir concessões
O céu de brigadeiro de 2010 para os reajustes salariais parece mais distante do que os seis meses incompletos deste ano podem indicar. O ritmo de crescimento da economia é menor, a inflação é mais elevada e, além disso, o governo federal move, desde o início do ano, uma política de aperto na atividade que começa a chegar nas negociações do funcionalismo. O rendimento médio real dos trabalhadores cresceu apenas 1,9% em abril deste ano, na comparação com o mesmo mês do ano passado - a alta chegou a ser de 6,5% reais em outubro de 2010, na comparação anual. A combinação virtuosa entre inflação baixa e a concentração de negociações dos sindicatos mais fortes e organizados, entre setembro e outubro, foi embora - o salário habitualmente recebido pelos trabalhadores em abril foi 2,8% menor, em termos reais, que o embolsado em outubro.
Usada na maioria das negociações salariais, a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que acumulara 4,6% nos 12 meses terminados em setembro de 2010, chegou a 6,4% nos 12 meses terminados em maio deste ano - em maio e junho do ano passado, o INPC acumulara 5,3% e 4,7%, respectivamente. Assim, o reajuste de 8,5% nos salários dos três mil trabalhadores da indústria têxtil de Curitiba, concedido em maio de 2010, representou elevação de 3,2% acima da inflação nos salários. Já neste ano, ainda que com um reajuste apenas um pouco inferior - de 8% nominal -, o ganho real caiu pela metade. O quadro se repetiu para os 180 mil comerciários do Rio de Janeiro, cujo ganho real de 0,4% conquistado neste ano foi quatro vezes menor que o recebido no ano passado.
Uma resposta sindical há tempos fora do noticiário voltou com força neste primeiro semestre - as greves. Descontentes, muitas categorias mobilizaram-se em assembleias e cruzaram os braços. Em alguns casos, como o dos 28 mil trabalhadores da indústria da borracha (como pneus) de São Paulo, a decretação do estado de greve fez as companhias cederem - o ganho real deste ano, de 2,6%, foi superior aos 2% obtidos em 2010.Nem todas as mobilizações, no entanto, resultaram em vitória para os trabalhadores. Não houve acordo entre os trabalhadores e a indústria têxtil de Brusque (SC) para o reajuste deste ano. Os trabalhadores não aprovaram a proposta patronal de 6,5% de reajuste - 0,1% acima da inflação do período. Segundo Aníbal Boetger, presidente do sindicato dos trabalhadores, o pedido é de 7,5% de reajuste. O piso salarial passaria de R$ 780 para R$ 830, o que corresponde ao INPC do período. Depois da primeira audiência conciliatória, sem acordo, os sindicatos patronal e de trabalhadores devem brigar na Justiça do Trabalho.
Ao mesmo tempo, estatais seguem diretriz defendida pela presidente Dilma Rousseff, para quem a concessão de ganhos salariais reais neste ano pode colocar mais lenha na fogueira inflacionária.
"Os negociadores do grupo Eletrobras foram claros: a presidente fincou o pé, não é para ter reajuste real neste ano", diz Carlos Reis, presidente do Sindicato dos Eletricitários de São Paulo. Segundo Reis, as negociações deste ano são "inusitadas". Enquanto as empresas privadas seguem a tendência do mercado, isto é, usam a inflação mais elevada como defesa contra reajustes mais elevados, as companhias federais (como Furnas, Chesf, Eletronorte, Eletrosul e Eletronuclear), que deram reajustes polpudos nos últimos anos, estão firmes contra o ganho real. Já a Cesp, estatal paulista do setor elétrico, aceita negociar elevação real.
O Sindicato dos Eletricitários de Furnas (Sindefurnas), que representa os funcionários da estatal em três Estados (MG, MT e GO), promoveu greve de dois dias na semana passada. A mobilização envolveu todo o quadro, à exceção dos profissionais que atuam em serviços essenciais. "Foi o que permitiu a reabertura das negociações", relata Antoninho de Freitas Furtado, diretor financeiro do Sindefurnas. "A Eletrobras já tinha dado as negociações por encerrado, com a concessão somente da inflação, conforme determinação da Dilma", complementa Furtado. Sindicato e Eletrobras se reúnem amanhã para novas conversas.
O responsável pelas relações sindicais do Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), Marcos Benjamin, afirma que as negociações neste ano estão na quarta rodada e estão sendo dificultadas pelo corte de R$ 50 bilhões no Orçamento da União. A proposta atual, diz, é de corrigir os salários só pelo IPCA acumulado de maio de 2010 a abril de 2011, de 6,51%, dividido em duas parcelas.
Em setores como construção civil, onde o aquecimento econômico têm gerado, desde o fim de 2009, problemas como falta de mão de obra qualificada na quantidade demandada pelas empresas, os sindicatos têm conseguido elevados ganhos salariais. Em São Paulo, os 370 mil operários do setor viram seus ganhos reais saírem de 2,7% conquistados em 2010 para 3,4% nas negociações deste ano.
No Distrito Federal, o reajuste foi de 17% para o piso e de 9% para as demais categorias da construção. O ganho real da categoria "outros" foi de 2,7% ante 3% em 2010. Segundo Izídio Santos Jr., do Sinduscon-DF, a redução não deve ser considerada expressiva porque o setor deu diversos "aumentos espontâneos" durante o ano passado para reter os profissionais, o que acaba compensando esse resultado menos expressivo. Sobre a alta de 17% para o piso (serventes, vigia, etc.), ele também considera que houve uma correção da defasagem salarial. "Historicamente, nunca houve um aumento tão grande nesse segmento", disse.
Em Blumenau, trabalhadores de cerca de mil indústrias de material elétrico fecharam acordo com os empresários no começo de maio. Segundo Hans Bethe, presidente do sindicato patronal, o piso da categoria teve reajuste de 11%, passando para R$ 832,50. O aumento médio de salários nessa atividade será de 7,5%, ganho real de 1,2%.
O Sindicato dos Trabalhadores da Indústria de Alimentação, que representa os funcionários da Sadia, fechou reajuste real de 1,6%.
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