O mercado de trabalho brasileiro registrou 8,2 milhões de trabalhadores terceirizados em 2010, segundo pesquisa do Sindeprestem, o sindicato que representa as empresas prestadoras de serviços a terceiros. Atuando nos mais diversos segmentos da economia, nos setores público e privado, esses prestadores de serviços são regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Quando essas normas são violadas e o litígio entre
empregado e empregador vai parar nos tribunais, cabe à Justiça do Trabalho
resolver a questão. Contudo, quando o conflito envolvendo terceirizados
extrapola as relações de trabalho e invade outras áreas do Direito, o Superior
Tribunal de Justiça (STJ) pode ser acionado. Confira os principais casos.
Cadastro de reserva x terceirizados
Candidatos aprovados em concurso público têm direito à
nomeação se demonstrarem a existência de trabalhador temporário exercendo a
função para a qual concorreram? O STJ entende que o direito líquido e certo à
nomeação só ocorre quando o candidato for aprovado dentro do número de vagas
oferecidas no edital do certame.
O Tribunal já havia decidido que a administração pública
não pode contratar funcionários terceirizados para exercer atribuições de cargos
para os quais existam candidatos aprovados em concurso público válido, dentro do
número de vagas oferecidas em edital. Nesses casos, os candidatos têm direito
líquido e certo à nomeação.
A controvérsia persistiu quanto à ocupação precária dessas
vagas enquanto houvesse candidatos aprovados em concurso fora das vagas
previstas. No ano passado, a Terceira Seção decidiu, por maioria de votos, que a
nomeação dos aprovados nesses casos não é obrigatória.
A tese foi fixada no julgamento de um mandado de segurança
impetrado por diversos candidatos aprovados para o cargo de fiscal federal
agropecuário. A maioria dos ministros entendeu que não é a simples contratação
temporária de terceiros no prazo de validade do certame que gera direito
subjetivo do candidato aprovado à nomeação. “Impõe-se que se comprove que essas
contratações ocorreram, não obstante existissem cargos de provimento efetivo
desocupados”, explicou o ministro Arnaldo Esteves Lima, relator do processo (MS
13.823).
A hipótese foi tratada novamente no início de 2011, em um
julgamento na Primeira Turma. Uma candidata aprovada em terceiro lugar para o
cargo de fisioterapeuta da Polícia Militar de Tocantins foi à Justiça para ser
nomeada. Como foram oferecidas apenas duas vagas, ela ficou em cadastro de
reserva. A candidata alegou que tinha direito à nomeação porque a administração
pública necessitava de mais servidores, o que ela demonstrou apontando a
existência de funcionário terceirizado exercendo a função.
O relator do caso, ministro Humberto Martins, explicou que
a existência de trabalho temporário não abre a possibilidade legal de nomeação,
pois não ocorre a criação nem a desocupação de vagas. Segundo a jurisprudência
do STJ, o candidato inscrito em cadastro de reserva possui mera expectativa de
nomeação, que passa a ser um direito somente após a comprovação do surgimento de
novas vagas durante o prazo de validade do concurso. (AgRg no RMS
32.094)
Em outro processo semelhante, no qual se discutia a
nomeação de professores do ensino fundamental em Mato Grosso, a Segunda Turma
decidiu que a contratação temporária fundamentada no artigo 37, inciso IX, da
Constituição Federal, não implica necessariamente o reconhecimento da existência
de cargos efetivos disponíveis. “Nesses casos, a admissão no serviço ocorre não
para assumir um cargo ou emprego público, mas para exercer uma função pública
marcada pela transitoriedade e excepcionalidade, devidamente justificada pelo
interesse público”, afirmou o relator do caso, ministro Castro Meira. (RMS
31.785)
Competência
Chegam frequentemente ao STJ dúvidas quanto ao foro
competente para julgar determinadas ações envolvendo trabalhadores
terceirizados: a justiça trabalhista ou a justiça comum. Essas questões são
resolvidas no processo denominado conflito de competência.
A Emenda Constitucional (EC) 45, de 2004, atribuiu à
Justiça do Trabalho a competência para processar e julgar ações oriundas da
relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da
administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios. Essa competência também incluiu as ações de
indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho e
as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores
pelos órgãos de fiscalização das relações trabalhistas.
Essa orientação atingiu todos os processos em trâmite na
Justiça comum estadual que ainda estavam pendentes de julgamento de mérito.
Porém, se a decisão de mérito tiver sido proferida pelo juízo comum antes da
mudança, fica mantida a competência recursal do tribunal comum.
Em outras palavras: as ações que tramitam perante a Justiça
comum dos estados, com sentença de mérito anterior à promulgação da EC 45/04, lá
continuam até o trânsito em julgado e sua execução. Quando não houver apreciação
de mérito, a ação deve ser remetida à justiça trabalhista, no estado em que se
encontram, com total aproveitamento dos atos praticados até então (CC 71.604, CC
82.432, REsp 956.125).
Responsabilidade Civil
Empresa pública ou prestadora de serviço público que
utiliza força de trabalho terceirizada é responsável pelos atos ilícitos
cometidos por funcionário terceirizado. Seguindo essa jurisprudência consolidada
no STJ, a Terceira Turma manteve a Companhia de Energia Elétrica do Rio Grande
do Sul no pólo passivo de uma ação de indenização movida por uma consumidora.
Segundo os autos, um funcionário terceirizado da empresa
foi à residência do pai da autora da ação para efetuar o corte de energia por
inadimplência. A moça afirmou que o terceirizado a ofendeu com expressões
racistas e deu-lhe dois socos no pescoço. A companhia energética alegou que não
era parte legítima no processo porque o agressor era funcionário de empresa que
presta serviços terceirizados.
A ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, ressaltou que
o funcionário foi à residência do pai da vítima em nome da companhia energética,
atuando na qualidade de seu preposto. Trata-se de responsabilidade objetiva da
concessionária de serviço público, conforme prevê o parágrafo 6º do artigo 37 da
Constituição Federal (REsp 904.127).
Ao julgar recurso especial em uma ação de indenização
decorrente de acidente em agência bancária, a Terceira Turma manteve a
condenação do Banco Bradesco a indenizar um policial militar que levou um tiro
de um vigilante terceirizado do banco. O Bradesco alegou que não poderia ser
responsabilizado pelo acidente por ausência de culpa. Sustentou que cumpriu a
legislação que regula o sistema financeiro e que contratou uma empresa de
segurança com tradição no mercado, tomando todas as cautelas possíveis.
Com base na interpretação do artigo 3º da Lei n.
7.102/1983, os ministros do STJ entendem que a responsabilidade pela segurança
dentro das agências é imputada à própria instituição financeira, que pode
promovê-la com pessoal próprio, desde que treinado, ou mediante terceirização.
Dessa forma, o banco e a empresa prestadora do serviço de vigilância são
solidariamente responsáveis pelos danos causados pelo funcionário (REsp
951514).
Em outra ação de indenização por danos morais e materiais,
não ficou demonstrada a responsabilidade do contratante do serviço terceirizado.
Uma construtora contratou uma empresa para transportar seus funcionários.
Durante a prestação do serviço, uma peça do ônibus em movimento atingiu um
pedestre que estava no acostamento.
O STJ manteve decisão que afastou a responsabilidade
objetiva da construtora devido à ausência da relação de preposição entre as
empresas ou entre o motorista do ônibus e a construtora. Ou seja, quem contratou
não exercia comando hierárquico sobre o preposto da terceirizada. Segundo a
jurisprudência da Corte, o tomador de serviço somente será objetivamente
responsável pela reparação civil dos atos ilícitos praticados pelo funcionário
terceirizado quando houver entre eles uma relação de subordinação.
Existe a possibilidade de responsabilizar a contratante do
serviço terceirizado por escolher mal a empresa prestadora. É a chamada culpa in
eligendo. No caso da construtora e da empresa de transporte, essa tese não foi
discutida. Mas em outro processo, o STJ manteve o dever de indenizar imposto a
uma instituição de ensino por danos causados por funcionário da empresa de
segurança que contratou sem tomar os devidos cuidados (REsp 1.171.939, AgRg no
Ag 708.927).
Previdência
Em julgamento de recurso repetitivo (REsp 1.131.047), a
Primeira Seção do STJ consolidou a tese de que, após a vigência da Lei n. 9.711
(que alterou a Lei. 8.212/91), “a empresa contratante é responsável, com
exclusividade, pelo recolhimento da contribuição previdenciária por ela retida
do valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços, afastada, em
relação ao montante retido, a responsabilidade supletiva da empresa prestadora,
cedente de mão de obra”.
Segundo a interpretação do STJ, a Lei n. 9.711 instituiu a
responsabilidade pessoal do tomador dos serviços de mão de obra pelas
contribuições previdenciárias, mediante um sistema de substituição tributária: o
contratante dos serviços, ainda que em regime de trabalho temporário, ficou
obrigado a reter 11% do valor da nota fiscal ou fatura e recolher a importância
retida em nome da empresa cedente da mão de obra.
A Primeira Turma também decidiu que, mesmo antes da Lei n.
9.711/98, o INSS podia cobrar as contribuições relativas a trabalhadores
terceirizados da empresa em que eles executavam suas tarefas, em vez daquela que
os registrava como empregados e cedia sua mão de obra mediante contrato de
prestação de serviços. (REsp 719.350 e REsp 1.131.047).
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